Em outros textos desta série, abordamos a faculdade de cinema e audiovisual e o mercado de trabalho na área. Exploramos as carreiras que envolvem o mercado audiovisual, a formação em uma faculdade de cinema, as características e o funcionamento desse mercado. Vamos agora conhecer a história do cinema no mundo e no Brasil.

Como setor de mercado, o audiovisual ultrapassa o cinema, incluindo a televisão, os videoclipes, os vídeos publicitários e empresariais, vídeos para internet, entre outros. Mas é inegável que sem o cinema, nada disso existiria.

O QUE É, ENTÃO, O CINEMA?

No início, cinema era o mesmo que filme: uma sequência de imagens captadas de modo a gerar a ilusão de movimento. Foi para esse propósito que os franceses conhecidos como irmãos Lumière organizaram a exibição tida como marco de nascimento do cinema, em 28 de dezembro de 1895, em Paris. Na exibição, mostraram em uma projeção a saída dos operários de uma fábrica em Lyon.

O cinematógrafo dos Lumière – que têm sua invenção questionada, havendo possíveis inventores anteriores – é a tecnologia que permitiu essa captura de imagens. Uma série de equipamentos vinha sendo inventada na época para esse fim, como uma evolução natural da fotografia, incluindo nomes como o americano Thomas Edison. Mas é na França que o cinema deu seus primeiros passos.

Os pais do cinema

Os Lumière, filhos de um fotógrafo, são conhecidos como pais do cinema pelo ponto de vista técnico. O interesse deles era tecnológico e científico. Foram outras pessoas que enxergaram o potencial do cinema como mídia ficcional.

Essa transição é geralmente atribuída ao francês George Méliès, o pai do cinema de ficção. Encantado com a invenção do cinematógrafo, Méliès experimentou a tecnologia, produzindo documentários e cenas corriqueiras, até montar seu grande filme, Viagem à Lua, de 1902, um marco na história do cinema de ficção.

Irmãos Lumière

Auguste (esquerda) e Louis (direita) Lumière, foto de 1890 e colorida posteriormente (Fonte: Alchetron)

A mãe do cinema

Hoje já temos acesso a uma revisão histórica importantíssima. Antes de Méliès, o cinema de ficção teve uma mãe. Alice Guy-Blaché, também francesa, se tornou a primeira diretora e produtora-executiva da história do cinema.

Ainda em 1896, enquanto Méliès rodava cenas documentais semelhantes às da exibição dos Lumière, Alice criava sua primeira obra de ficção com a participação de atores, o filme A Fada dos Repolhos. Ela também foi a primeira a sincronizar as imagens filmadas no cinematógrafo com os sons oriundos de outro aparelho, o gramafone.

Solidificando a sétima arte

Essa primeira fase mostra o caminho experimental do cinema e uma de suas características fundamentais:
a construção a partir de outras artes. O início da história do cinema já apresenta a influência da fotografia, da pintura, do teatro e da dança em suas primeiras tentativas. Mesmo no cinema mudo, que domina os primeiros anos do cinema e segue forte até a década de 20, a música já se fazia presente com as orquestras nas salas de cinema, reproduzindo ao vivo as trilhas sonoras.

Por essa junção de diferentes e nobres artes, o cinema é conhecido como a sétima arte. A maior especificidade do cinema talvez esteja no corte, o elemento que trouxe ao cinema a ideia de montagem. O corte foi uma evolução do americano DW Griffith, ainda no início do Século XX.

DW Griffith, pioneiro na história do cinema

DW Griffith, pioneiro no corte de filmes (Fonte: Os Anos Perdidos)

A HISTÓRIA DO CINEMA

O cinema não demorou a chegar no Brasil, com os primeiros filmes sendo produzidos já no início do século, em sua maioria com caráter histórico. Muito antes do Cinema Novo, movimento brasileiro que alçou nosso cinema aos olhos internacionais, o filme Limite (1930), de Mário Peixoto, já marcava o potencial brasileiro na sétima arte. O filme Limite é uma das obras selecionadas pela World Cinema Foundation para restauração, preservação e exibição de produções históricas do cinema. Essa fundação foi fundada por ninguém menos do que Martin Scorcese.

Década de 20

A década de 20 apresenta os primeiros importantes movimentos cinematográficos no mundo. No mesmo período surgem o Expressionismo Alemão, a Avant-Garde Francesa e o Construtivismo Russo. Esses movimentos têm influência até os dias de hoje com suas inovações em perspectiva, iluminação, planos, uso de mais de uma câmera, montagem, entre outros.

Nos Estados Unidos, a Era dos Estúdios faz o cinema avançar como lazer para as massas com a importância de figuras como Charlie Chaplin e Buster Keaton. É também nessa década que nasce a televisão, ainda engatinhando.

Década de 30

Os anos 30 trazem o cinema falado e o início dos gêneros cinematográficos. É o início da Era de Ouro de Hollywood, que tenta se recuperar da Crise de 1929. Faroestes, musicais, comédias e dramas já ocupam as telas.

Ainda nessa década, mesmo que em poucas produções, as cores fazem sua entrada no cinema, em clássicos como E O Vento Levou (1939) e O Mágico de Oz (1939). As animações dão o primeiro passo para o mundo das cores com A Branca de Neve e os Sete Anões (1937).

Década de 40

A década de 40 é uma fase de extremos. A Segunda Guerra Mundial era realidade e influenciava todo o mundo. Alguns dos filmes considerados entre os melhores da história do cinema davam suas caras nessa época, como Cidadão Kane (1941) e Casablanca (1942).

O cinema Noir dominava as salas de exibição americanas, enquanto na Europa, o Neorrealismo Italiano chacoalhava a forma de se fazer cinema. Filmes eram gravados em locações externas, fora dos estúdios, muitas vezes com atores não profissionais. As obras abordavam forte temática social. Com tudo isso, o Neorrealismo tornou-se um dos movimentos mais influentes da história do cinema.

Pôster do filme Cidadão Kane

Pôster do filme Cidadão Kane (Fonte: O Rato Cinéfilo)

Década de 50

A década de 50 apresenta um dos movimentos cinematográficos mais famosos: a Nouvelle Vague Francesa. Figuras como Agnes Varda, Jean-Luc Godard e François Truffaut entram para a história do cinema.

Nos Estados Unidos, atores como Marilyn Monroe e Marlon Brando se tornam icônicos. Alfred Hitchcock se destaca na criação de suspenses. Musicais como Cantando na Chuva (1952) entram para a história.

Contudo, a década de 50 talvez seja ainda mais importante pela expansão do audiovisual para além do cinema. É nela que tem início a Era de Ouro da TV estadunidense.

Com a chegada das cores à televisão nos Estados Unidos, os programas de auditório explodem e seriados de televisão com linguagens visuais diferentes das usadas no cinema começam a conquistar o público.

No Brasil, a televisão ainda não tem cores, mas já causa uma revolução com a chegada das novelas. As narrativas de folhetim, que tinham grande público no rádio, começam a tomar seu espaço na televisão, rumo à grande marca do audiovisual brasileiro.

No cinema, as chanchadas fazem sucesso a partir do fim da década de 40 e durante os anos 50, com destaque para o ator Grande Otelo.

Década de 60

Os anos 60 apresentam um cenário complexo, com as muitas influências dos movimentos cinematográficos anteriores.

A geração nascida no período da Segunda Guerra Mundial começa a chegar à idade adulta. O rock se populariza e movimentos sociais tomam inúmeros lugares do mundo, trazendo discussões sobre racismo, feminismo, homofobia. O ano de 1968 entra para a história como o ano das revoltas populares e movimentos sociais. É nesse mesmo ano que Stanley Kubrick se consolida como um dos grandes nomes do cinema contemporâneo com 2001: Uma Odisseia no Espaço.

A indústria da propaganda passa por uma revolução e tem um boom no período que avança na década de 60 até a década de 70. Esse período ficou marcado como a era dos Mad Men, os gigantes da publicidade. A reconstrução histórica desse período gerou uma das grandes séries dos últimos anos, o seriado Mad Men (2007).

Set de filmagem

Set de filmagem de novela em Cabo Frio (Fonte: A SHAMA)

O Cinema Novo

No Brasil, até então o chamado Cinema Novo engatinhava com algumas influências das décadas anteriores, com cineastas como Nelson Pereira Santos. Na década de 60, porém, tem seu crescimento na fase pré-ditadura.

Glauber Rocha, o grande nome do cinema brasileiro, faz sua contribuição nessa fase com filmes como Deus e o Diabo na Terra do Sol (1964), um filme produzido antes da ditadura, Terra em Transe (1967), um filme produzido com a ditadura já em vigor, e também com o manifesto Uma Estética da Fome, marco do Cinema Novo e do cinema brasileiro como um todo.

A produção cinematográfica brasileira sofre com a chegada da ditadura e o crescimento da censura. Essa quebra faz com que o Cinema Novo se divida em diferentes fases, indo até a década de 70 para alguns teóricos e mantendo influência até a década de 90 para outros.

O Cinema Novo, também na figura de Glauber Rocha, estabelece uma cultura de fazer cinema que influencia a produção audiovisual brasileira até hoje. A famosa frase “uma câmera na mão e uma ideia na cabeça” fortalece a figura do diretor, em detrimento da história (os roteiristas) e da produção. Diretores, não à toa, são chamados e vistos como cineastas ou realizadores no senso comum brasileiro, tamanha a centralidade que a figura do diretor assumiu no nosso audiovisual.

Primeira novela da história do audiovisual no Brasil

Glória Menezes e Tarcísio Meira, casal da Globo, estiveram na primeira novela da televisão brasileira (Fonte: Globo)

As novelas

Também nessa década nasce a Globo, uma das maiores emissoras de TV do planeta, e as novelas alcançam popularidade nacional. Nelas, a outra face da moeda do audiovisual brasileiro se concretiza.

Novelas são narrativas de “arco longo”, ou seja, que se estendem por meses, enquanto filmes se estendem por duas horas em média. Manter uma narrativa de meses apenas com uma ideia na cabeça é praticamente impossível. Por esse motivo, nas novelas, a figura de destaque é o autor. Janete Clair, uma das maiores autoras da história da televisão brasileira, começou seus passos na mídia audiovisual na TV Tupi e ainda na década de 60 ingressou na Globo.

A dupla identidade do audiovisual brasileiro

Muitos estudiosos caracterizam o audiovisual brasileiro por essa dupla identidade na forma das novelas e do Cinema Novo.

As novelas trouxeram uma cultura de autor em um formato que surgiu nas rádios e no qual o áudio tem grande importância. Dessa forma, criou-se um estilo de diálogo próprio da televisão brasileira.

No Cinema Novo, por outro lado, temos uma cultura de diretor de um cinema de arte, na qual ideias e imagens ganham força sobre a história e o diretor centraliza a força da produção.

Ambos os fenômenos são um testamento da influência da década de 60.

Década de 70

A década de 70 traz a cor para a televisão brasileira. A Copa do Mundo de 1970 foi um marco dessa chegada, ainda que em poucos lares.

No cinema, a fundação, em 1969, da Embrafilme, empresa estatal de economia mista, começa a fomentar a produção de novos filmes nacionais. O Brasil passa a produzir mais filmes nos anos 70, com algumas obras clássicas como Xica da Silva (1976), de Cacá Diegues, Dona Flor e seus Dois Maridos (1976) de Bruno Barreto, e uma série de filmes dos Trapalhões.

A virada dos anos 60 para os 70 também traz no Brasil interessantes movimentos, como o Cinema Marginal, que promovia um cinema de baixo orçamento, e as Pornochanchadas, gênero que obteve grande sucesso comercial.

Nos Estados Unidos, uma nova geração de cineastas produz filmes icônicos, incluindo Martin Scorcese com Taxi Driver (1976), Francis Ford Coppola com O Poderoso Chefão I e II. Nessa década inaugura-se era dos blockbusters nas figuras de Steven Spielberg com Tubarão (1975), considerado o primeiro blockbuster da história do cinema, e George Lucas com Star Wars (1977), o início da maior saga da história do cinema.

Fila no cinema para ver Star Wars

Fãs se alinham do lado de fora do Vogue Theatre na Theater Row para a primeira exibição de Star Wars em 24 de junho de 1977.

(Fonte: Uol)

Década de 80

A década de 80 traz novas revoluções. Os blockbusters tomam o cinema norte-americano, levando os valores de bilheteria e os orçamentos de produções a novos recordes. Os filmes norte-americanos se tornam cada vez mais internacionais.

Filmes de ação também se tornam populares com as novas tecnologias de efeitos visuais e práticos. Personagens hipermasculinos tomam as telas nas figuras de Sylvester Stallone e Arnold Schwarzenegger, entre outros.

A queda da economia brasileira, já a partir da segunda metade da década de 70, afeta a Embrafilme e o cinema nacional nos anos 80. Documentários se destacam nessa fase na cadeia de produção nacional, com destaque para o lendário cineasta Eduardo Coutinho.

Fora do cinema, a televisão não sofria com o recesso econômico, produzindo algumas das principais novelas brasileiras, como Roque Santeiro (1985) e Vale-Tudo (1988).

A maior mudança nesse período vem de fora, na união dos mercados da música com o audiovisual. Através do sucesso do canal MTV, os videoclipes tomam a cultura pop, alçando artistas da música ao estrelato. Em especial, Michael Jackson, com o seu álbum Thriller (1982), se torna o Rei do Pop, impactando o mundo da música e do audiovisual com o histórico lançamento do videoclipe de Thriller. Essa década também viu Madonna se tornar a Rainha do Pop.

Notícia de fechamento da Embrafilme

Página 5 do jornal “O País”, 10 de abril de 1990. (Fonte: Acervo O Globo)

Década de 90

A década de 90 começou aterrorizando o cinema brasileiro quando, no governo Collor, a Embrafilme foi extinta. Apenas três filmes brasileiros chegaram aos cinemas no ano de 1992 com o baque. É a partir de 1993 que o cinema nacional entra na fase conhecida como Retomada, que mantém seu impacto até hoje, com a criação de leis de incentivo ao audiovisual brasileiro e o apoio à criação de novas produtoras e de uma nova classe artística.

A partir dos anos 90, duas grandes mudanças chegam ao mercado: a televisão paga, no Brasil, e a internet, no mundo.

A TV a cabo muda a forma de se consumir televisão gradualmente, à medida que a população brasileira viu um crescimento suave de renda. O público passa a ter acesso a mais canais e o consumo de obras estrangeiras se torna mais fácil.

Por sua vez, a internet começa a mudar a vida do planeta na década de 90, mas é nos anos 2000 que ela absorve o audiovisual em sua realidade. Surgem os sites de vídeo, sendo o YouTube o maior deles, popular até hoje. Na década de 2010, as plataformas de VOD (Video on Demand) se tornam realidade, com a Netflix como pioneira.

CENÁRIO ATUAL

Hoje, o audiovisual vive um cenário multimídia. O cinema ainda é o lugar das grandes experimentações e de maior glamour, mas a TV deixou de ser uma plataforma de obras de menor qualidade, no caso dos seriados, para entrar em uma nova era de ouro nas últimas duas décadas, com séries superpremiadas e de qualidade cinematográfica.

A invasão do streaming mudou a relação com o público, especialmente o mais jovem, fazendo com que o mercado brasileiro, fortemente baseado em novelas, passasse por uma grande transformação nos últimos anos. Ainda assim, a última década nos deu um sucesso estrondoso na TV aberta com a novela Avenida Brasil (2012).

O YouTube nos apresentou a videoclipes vistos mais de 1 bilhão de vezes, sendo Gangnam Style (2012) o primeiro vídeo a alcançar o feito. Com essa popularização do audiovisual, empresas passam a investir mais em vídeos institucionais. As propagandas, por sua vez, saem da TV para a internet, os smartphones e até para o ambiente das grandes cidades, em paradas de ônibus ou em telas no transporte público.

Entramos na nova década de 2020 com um mercado audiovisual que parece estar em todos os lugares a todos os momentos. Sem dúvidas, um mar de oportunidades, com muitas carreiras interessantes a serem seguidas. Um universo que você conhecerá mais a fundo na faculdade de Cinema e Audiovisual.

Set para filmagem de cinema

Pequeno set para filmagem (Fonte: Pinterest Museus Hoje)

Este texto, é claro, é uma visão relativamente rápida da complexa história do cinema, que combina evolução tecnológica, diferentes manifestações artísticas e questões socioeconômicas. O mercado de cinema e audiovisual é bastante sólido, com certeza muito duradouro e uma área muito interessante profissionalmente, que permite tanto a realização pessoal quanto profissional. Deixe seu comentário, dúvida ou sugestão no espaço a seguir!

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